Farra das isenções fiscais:
ex-servidor da Receita é alvo de ação
MP acusa George Santoro por favorecimento à empresa
por mais de uma década que fez estado abrir mão de arrecadação milionária
Por Beatriz Perez e
Fernando Miragaya
Publicado às 06h00 de
28/02/2019 - Atualizado às 10h38 de 28/02/2019
Rio
- Se depender dos generosos incentivos fiscais concedidos na era Sérgio Cabral,
o Ministério Público do Estado (MPRJ) terá trabalho por longo tempo. Em outro
escândalo da farra das isenções, o ex-subsecretário de Receita do Rio, George
Santoro, é réu em Ação Civil Pública que aponta irregularidades em benefícios
tributários a uma empresa de distribuição por mais de uma década. No total, o
estado deixou de arrecadar mais de R$ 213 milhões
O
processo está na 16ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro e acusa a
Zamboni Comércio Ltda. de usufruir, por mais de 10 anos, de redução
significativa do ICMS sem cumprir nenhuma das cinco exigências previstas no
Termo de Adesão. O mais inusitado é que desde 2008 o benefício foi prorrogado
diversas vezes sem que a empresa cumprisse com as obrigações.
“Temos
suspeitas de que agentes públicos teriam recebido propina. Mas uma coisa é
certa: muitos agentes públicos contribuíram para que a Zamboni enriquecesse.
Não tem como competir com uma empresa que paga 18% a menos em um imposto”,
ressalta o promotor Vinicius Leal Cavalleiro, coordenador do Grupo de Atuação
Especializada no Combate à Sonegação Fiscal (Gaesf).
George
Santoro foi subsecretário de Receita do Estado do Rio entre 2013 e 2015 -
atualmente, é secretário de Fazenda de Alagoas. Assim como seus antecessores e
sucessores de pasta, era o responsável por acompanhar, a cada dois meses, o
cumprimento das condições estabelecidas para que a empresa continuasse
recebendo o incentivo fiscal.
O MP,
porém, aponta como agravante o fato de Santoro usar o cargo em benefício da
Zamboni. De acordo com a petição, em outubro de 2014, a Secretaria de Estado de
Fazenda (Sefaz) editou portaria que enquadrava a empresa no modelo de
Tratamento Tributário Diferenciado. Isso antes de o órgão responsável por
avaliar os pedidos, a Comissão Permanente de Políticas para o Desenvolvimento
do Estado (CPPDE), analisar a solicitação da Zamboni.
A empresa
de distribuição, porém, já não havia cumprido nenhuma das exigências até
então. Com sede em Além Paraíba (RJ), a Zamboni se instalou na vizinha Sapucaia
(RJ) e requereu à Sefaz adesão ao regime tributário diferenciado previsto no
Decreto Estadual 40.016/06. Passou a pagar menos 18% de ICMS.
Para ter
direito ao incentivo, assinou Termo de Adesão e se comprometeu com cinco
contrapartidas. Entre elas garantir a geração de empregos e o desenvolvimento
econômico contínuo na região. Os R$ 27 milhões em aportes e os mais de 200
empregos, contudo, ficaram só na promessa para o município de Sapucaia.
Pior.
Segundo o MPRJ, foi constatado em diversas ocasiões que a Zamboni, nos
diferentes endereços que teve nesse período - alguns sem edificação e outros
com área pequena e incompatível com a atividade de distribuição -, chegou a ter
um único empregado por dois anos. Muitos funcionários declarados eram de outras
cidades do estado.
Além de
George Santoro e da Zamboni, Guillermo Gutierrez Hernández, auditor sênior da
Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado (Codin), e a Associação de
Atacadistas e Distribuidores (Aderj), também aparecem como réus no inquérito.
Segundo o
promotor Vinicius Leal Cavalleiro, muitas ações sobre benefícios fiscais
irregulares no segmento atacadista ainda estão por vir. Ele critica que tais
procedimentos não só comprometem o desenvolvimento do estado, como também a
livre concorrência, já que das 37 mil empresas do ramo que atuam no estado,
cerca de 3 mil ganham incentivos.
“A
continuar essa metodologia, estamos em um caminho para o buraco, pois se
estimula empresas que não produzem benefícios, enquanto outras têm de suportar
altíssima carga tributária”, critica o coordenador do Gaesf.
A
reportagem procurou George Santoro através da assessoria de comunicação da Secretaria
de Fazenda de Alagoas, que emitiu nota na qual afirma que “Todos os
esclarecimentos iniciais já foram encaminhados às instâncias devidas, mesmo
antes de sua ciência formal, com a confiança de que a Justiça avaliará o caso
com o necessário rigor”.
O grupo
Zamboni também se manifestou por nota. A empresa garante que “cumpre
rigorosamente a legislação vigente no Rio de Janeiro, assim como atende a todos
os pré-requisitos para participar dos programas de fomento do Governo”. A
companhia devolveu o terreno à prefeitura de Sapucaia e se instalou em Xerém,
Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
A Codin
alega, através de comunicado, que “à época (junho de 2018) ficou decidido que o
servidor continuaria no exercício de suas atribuições, pois não tem e nunca teve
cargo de confiança na Codin”. E diz que o atual presidente da Companhia, Fábio
Galvão, determinou a abertura de sindicância interna. “Caso o relatório
apresente elementos de autoria e materialidade, o processo administrativo será
remetido à Corregedoria Geral do Estado”, completa a nota.
A
assessoria de imprensa da Aderj explica que seu presidente em exercício,
Joílson Barcelos, assumiu o cargo recentemente devido ao falecimento de José
Couto, titular do cargo, no último domingo. Alega que Barcelos está em viagem
ao exterior e que retornará ao Rio no dia 11, quando estará à disposição da
reportagem para esclarecimentos sobre o caso.
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