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quarta-feira, 12 de abril de 2017

O que é a Securitização da Dívida Ativa e porque ela é um péssimo negócio para o Estado do Rio.


Estão vendendo gato por lebre
A ideia é genial! vender algo “podre” como a dívida do Estado para alguém que ainda se dispõe a pagar 40% ou até mais por isso. Parece um excelente negócio!
Mas você, caro leitor, pagaria quanto por uma dívida de 1 milhão da Mesbla? 50%, 10% do valor? E da Varig, você toparia?
Bom se você respondeu que não pagaria e entende a dificuldade de receber essa dívida, porque será que grandes bancos e financeiras (que podem ser acusadas de tudo, menos de ingenuidade) topariam esse negócio?
O que chamam de um nome bonito "Securitização" (as vezes se fala em "cessão", "novação" e outros termos estranhos ao cidadão comum) nada mais é do que a transferência de recursos públicos para o setor financeiro. E que acarreta o aumento da dívida pública e a redução da capacidade do Estado em investir a longo prazo em infraestrutura e no bem-estar da população.
A operação é assim: Os créditos da Dívida Ativa não saem do lugar. O que está sendo vendido é um papel novo, emitido por “empresa estatal não dependente”, ( no nosso caso será a já criada Companhia Fluminense de Securitização) que é uma pessoa jurídica de direito privado. As debêntures são vendidas a investidores com desconto de até 60% e juros sobre o valor de face. A Dívida Ativa só serve de parâmetro para indicar o tamanho da garantia dada pelo Estado para essa empresa.
Bom negócio para quem?
A Dívida Ativa corresponde, em sua maioria, a créditos incobráveis, pois são devidos por contribuintes que não têm como pagar seus débitos, tais como empresas falidas, não encontradas, ou que nunca existiram de fato. Devido a essas circunstancias, a maior parte da Dívida Ativa é considerada podre, isto é, não possui a menor chance de ser arrecadada.
No Rio de Janeiro, a Procuradoria Geral do Estado tem a responsabilidade em recuperar a Dívida Ativa. Na prática, A PGE tem conseguido arrecadar somente uma pequena parte da Dívida Ativa por ano, cerca de 1% do total. E uma parte que não é podre, ou seja, a parte correspondente a contribuintes que tiveram seus débitos inscritos em Dívida Ativa apenas devido a dificuldades momentâneas, perda de prazo, estratégia ou à necessidade de parcelamento, mas que conseguem regularizar sua situação, quando obrigadas.
Dessa forma, O Estado mantêm um estoque de Dívida Ativa que sabidamente não será arrecadada, até porque os recursos da PGE são finitos e o estoque da Dívida Ativa é crescente.
A securitização tão falada pelo governo nos meios de comunicação parece uma solução mágica: O Estado conseguiria vender essa Dívida Ativa podre para alguém que pagaria até 40% de seu valor. De fato, isso seria estupendo. Porém, é apenas uma ilusão. A Dívida Ativa não é vendida ou cedida e não sai do lugar. Os créditos não têm sua natureza ou condições de pagamento modificadas e continuariam sendo cobrados pelos respectivos órgãos competentes.
Na realidade, o que estaria sendo vendido para investidor privado é um papel novo (debênture) emitido pela Companhia Fluminense de Securitização, com desconto (deságio) que pode alcançar até 60% e pagando juros ao ano sobre o valor de face. O ganho proporcionado ao investidor é imenso, pois ele ainda poderá parcelar o pagamento dos 40% em alguns anos.
A Dívida Ativa serve apenas de parâmetro para indicar o tamanho da garantia dada pelo Estado para essa empresa. Tal garantia geralmente é formalizada por outro papel financeiro (debênture subordinada), também emitido pela empresa estatal não dependente e entregue ao Estado, que assim se obriga a assumir os riscos da operação. Dados da Secretaria de Fazenda de São Paulo, onde operação semelhante ocorre, atestam que as debêntures subordinadas servem para documentar as garantias concedidas pelo Estado.
Devido às condições financeiras incluídas desse esquema, essa garantia irá crescer exponencialmente, como aconteceu na Europa, onde esquema semelhante foi descoberto durante os trabalhos de auditoria da dívida na Grécia.
Não há dúvida de que estamos diante de um excelente negócio somente para quem compra esses papéis com desconto de 60% e recebe remuneração anual atualizada com os juros brasileiros.

Esse negócio é legal?
Esse negócio já foi implementado em alguns estados e municípios. Entrou no país por meio de consultorias especializadas que contam com técnicos que possuem pedigree do FMI, a exemplo da ABBA Consultoria e Treinamento, cujo consultor responsável – Edson Ronaldo Nascimento – tem ocupado posições relevantes, diretamente vinculadas à implantação de sua consultoria, tais como: Presidente da PBH Ativos S/A; Superintendente Executivo da Secretaria de Fazenda do Estado de Goiás; Secretário de Fazenda do Estado de Tocantins. Por sua vez, o ex-secretário de Fazenda dos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo – Renato Vilela – é um dos sócios da empresa CPSEC, a estatal não dependente do Estado de São Paulo.
Alguns gestores públicos provocaram o Tribunal de Contas da União para que se manifestasse sobre o tema, conforme processo TC 016.585/2009-0, do qual consta manifestação do Ministério Público de Contas no sentido da ilegalidade dessa operação, conforme trechos transcritos a seguir:
“Trata-se, portanto, de desenho que apresenta em sua essência a mesma estrutura adotada pelos entes que optaram por criar uma empresa pública emissora de debêntures lastreadas em créditos tributários, por meio da qual o ente federado obtém do mercado uma antecipação de receitas que serão auferidas somente no futuro e que, quando o forem, serão destinadas ao pagamento dos credores, numa nítida e clara, ao ver do Ministério Público de Contas, operação de crédito, conforme o conceito amplo adotado no artigo 29, III, da LRF.”– “Arrumaram um subterfúgio ilegal com aparência legal para antecipação de receita e burlar a LRF – que pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, e regras para antecipação de receitas.”– “Esse mecanismo compromete as gestões futuras e prejudica a sustentabilidade fiscal do Município – as receitas parceladas em Dívida Ativa ou espontaneamente entrariam também no futuro ( em outras gestões).”
Não há dúvida de que esse negócio de emissão de debêntures por “empresa estatal não dependente”, com garantia pública, mascarado de "securitização", “cessão” ou “novação” de créditos podres corresponde a uma operação inconstitucional.
Na tentativa de “legalizar” esse esquema, foi apresentado, no Senado, o PLS 204/2016. Conforme consta de sua justificação, tal projeto de lei visa dar “segurança jurídica” às operações de cessão de direitos creditórios que já estão sendo realizadas em alguns estados e municípios. Projetos semelhantes tramitam na Câmara dos Deputados: PLP 181/2015 e PL 3337/2015.
Todos os referidos projetos PLS 204/2016, PLP 181/2015 e PL 3337/2015 mencionam expressamente que a “cessão” ou “novação” de créditos se dará em favor de “pessoa jurídica de direito privado”, que vem a ser a própria “empresa estatal não dependente”. Tal empresa é regida pelo direito privado por possuir sócios privados, mas é uma empresa estatal controlada pelo ente federado.
De fato, empresas estatais não dependentes já estão funcionando em diversas localidades, como por exemplo: PBH Ativos S/A em Belo Horizonte; CPSEC no Estado de São Paulo; SPSEC no município de São Paulo; PRSEC no Paraná; Recda em Recife, entre outras. Além da emissão de debêntures, tais empresas realizam outras operações com ativos públicos e patrimônio a ela doados ou “cedidos”.
Cabe ressaltar a enorme contradição relacionada à criação de empresas estatais não dependentes justamente quando se privatizam as empresas estatais lucrativas ainda restantes. Ademais, a emissão de debêntures nessas condições financeiras abusivas, sob a ilusão de “ceder” direitos de créditos, não constitui papel do Estado. As demais funções de administração de ativos públicos indicadas nas páginas web das referidas empresas são funções que a própria administração direta já executa, o que denota que o objetivo central dessas empresas estatais tem sido a emissão de debêntures.
Evidentemente, essas operações com debêntures gerarão prejuízo às empresas estatais não dependentes que vem sendo criadas para essa finalidade. Devido ao enorme desconto na venda das debêntures, aos juros abusivos e demais custos financeiros e administrativos, o valor arrecadado com essa venda é consumido em poucos meses e enorme dívida pública será gerada para o ente federado, sem contrapartida.
Conclusão
Essa engenharia financeira baseada na ilusão de venda de ativos podres consumirá no decorrer dos anos, incalculáveis volumes de recursos públicos e gerará elevado ônus financeiro para o Estado do Rio.
Configura transferência de recursos públicos para o setor financeiro por meio da geração de dívida pública sem contrapartida alguma.
É um desenho sofisticado para burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e endividar sem limite o Estado, que posteriormente ficará obrigado a sacrificar ainda mais os investimentos sociais e em infraestrutura para viabilizar o pagamento das dívidas geradas pela securitização.
A Sociedade Fluminense, que ao final paga essa conta, exige transparência e apuração das operações que estão por trás dessa ilusória propaganda de “securitização” de créditos que na verdade não saem do lugar.



Adaptado de:
http://www.auditoriacidada.org.br/blog/2016/09/20/pec-241-teto-para-investimentos-sociais-essenciais-e-garantia-de-recurso-para-esquema-fraudulento-que-o-pls-2042016-o-plp-1812015-e-pl-33372015-visam-legalizar/


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