RJ corta serviços essenciais para
conter déficit
Por Rodrigo Carro
O ajuste brutal de contas para
tentar debelar o déficit orçamentário de R$ 21 bilhões previsto para o Estado
do Rio levou o governo fluminense a cortar serviços em áreas essenciais. Nos
quatro primeiros meses do ano, as despesas liquidadas em educação, saúde e
segurança encolheram 15,12% em termos reais, quando comparadas ao mesmo período
de 2016. A pasta mais atingida foi a da saúde. Entre janeiro e abril deste ano,
foram liquidadas R$ 960 milhões em despesas, uma redução real de 34,26%,
considerando a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo
(IPCA).
A Secretaria de Estado de Saúde
do Rio de Janeiro confirma, por meio de sua assessoria, que a renegociação de
contratos e a reorganização do fluxo de atendimento, somadas a cortes de
custeio, totalizam uma economia de aproximadamente R$ 1,4 bilhão por ano.
"Apesar da grave crise financeira, todas as unidades da rede seguem em
funcionamento", acrescentou a secretaria, em resposta por e-mail.
A retração nos gastos é tão
severa que vem impedindo o governo do Rio de cumprir o percentual de
investimento mínimo em saúde, como aliás já aconteceu em 2016. Em vez dos 12%
da receita de impostos líquida e transferências constitucionais, o investimento
em saúde feito até abril chegava apenas ao patamar de 4,26%.
Na prática, essa lacuna se traduz
no encolhimento expressivo da oferta de serviços. "O Hospital
Universitário Pedro Ernesto já teve 600 leitos, reduziu para 250 e hoje já está
com 150 disponíveis", exemplifica Nelson Nahon, presidente do Conselho Regional
de Medicina (Cremerj). Ainda segundo Nahon, de um total de 320 leitos públicos
de UTI neonatal existentes no Estado, 250 (78%) são providos por hospitais
privados que têm a receber do poder público oito meses de pagamentos em atraso.
"A saúde do Rio vive hoje sua pior crise. A situação é catastrófica",
resume.
Com os tetos de endividamento e
gastos com pessoal estourados, o Estado vai tentar se readequar aos limites
estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), mas o retorno à
normalidade não seguirá necessariamente o ritmo ditado pela norma legal nem vai
passar por cortes de pessoal, garante o secretário fluminense de Fazenda e
Planejamento, Gustavo Barbosa.
Nós estamos com esse objetivo do
convergir. Agora, precisa ser uma convergência que seja factível. Posso demitir
30 mil, 40 mil servidores que são basicamente da segurança e da educação? Não
posso", disse Barbosa ao Valor. A LRF determina que o percentual excedente
da despesa total com pessoal deverá ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes,
ou seja, num prazo de oito meses.
Dentro do quadro financeiro atual do Estado
do Rio, o retorno à normalidade é pouco provável no curto prazo. "A
receita posta ali [no orçamento] nos impõe um ajuste brutal que é impossível de
ser feito", reconhece o secretário.
No fim de abril, o pagamento de
pessoal ativo e inativo consumia 69,57% da Receita Corrente Líquida (RCL) do
governo fluminense. O percentual estava quase dez pontos percentuais acima do
limite previsto. As alternativas legais para redução das despesas incluem o
corte de cargos em comissão e funções de confiança (já efetivado pelo Estado),
a exoneração de servidores não estáveis e, em último caso, a demissão de
funcionários públicos com estabilidade.
A maior parte dos servidores
contratados pelo governo fluminense nos últimos três anos - sem direito,
portanto, à estabilidade no emprego - é de professores e policiais, afirma
Barbosa, destacando a importância para o Rio das áreas de educação e segurança.
A resistência em fazer cortes de
pessoal num cenário de déficit fiscal agudo vem cobrando preço elevado sobre o
já minguado orçamento Nos primeiros quatro meses de 2017, as despesas
liquidadas nas áreas de saúde, educação e segurança caíram 11,64% em termos
nominais. A pasta mais atingida foi a da saúde, com recuo de 34,26% (em termos
reais) entre janeiro e abril deste ano, ante o mesmo período de 2016.
Na área de segurança pública, a
Polícia Civil ainda está às voltas com R$ 98,31 milhões em despesas em aberto
de 2016. O total, somado aos gastos previstos para este ano (R$ 163 milhões),
revela necessidade financeira de R$ 261,37 milhões para 2017, conforme indicam
dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Rio de Janeiro. O
problema é que o orçamento oficial da Polícia Civil para o ano é de R$ 136,02
milhões, dos quais somente R$ 10,55 milhões foram pagos até agora.
"Falta combustível e
manutenção para as viaturas policiais. Por isso muitas estão paradas",
conta Fernando Bandeira, presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado
do Rio de Janeiro (Sinpol).
Até semana passada, a dívida da Polícia Civil com
fornecedores de combustível totalizava R$ 2,46 milhões. Cortados por falta de
pagamento, os serviços terceirizados de limpeza nas delegacias foram
substituídos pela mão de obra dos próprios policiais. "As gratificações
para os policiais que se destacam não são pagas desde maio do ano
passado", conta Bandeira.
No cômputo geral, o orçamento de
segurança pública foi menos atingido do que o das pastas de saúde e educação.
Ainda assim, as despesas liquidadas caíram de R$ 2,47 bilhões, no primeiro
quadrimestre do ano passado, para R$ 2,4 bilhões no mesmo período de 2017 - uma
diminuição de 6,65% em termos reais.
Na educação, a retração - também
descontada a inflação medida pelo IPCA - foi de 14,53%. A pasta responde pelo
maior contingente de servidores públicos no Estado do Rio de Janeiro: são 79,58
mil servidores na ativa e 84,06 mil inativos. A proporção quase idêntica de
ativos e inativos na educação - um dos fatores responsáveis pelo engessamento
das despesas de pessoal - está longe de ser um caso isolado. O Estado do Rio tem pouco mais de um
aposentado ou pensionista para cada servidor estadual na ativa.
No Rio, as receitas começam a
reagir - em abril, maio e junho houve crescimento nominal, frente igual período
de 2016. A receita com royalties e participações especiais do petróleo também
está em alta. Passou de R$ 1,55 bilhão nos primeiros cinco meses de 2016 para
R$ 3,41 bilhões em igual período deste ano. "A questão é que eu tenho um
'gap' imenso e não dá para esperar a dinâmica de aumento de receita",
afirma Barbosa, para justificar a urgência de um socorro por parte da União.
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