Reforma permite que bancos
privados 'tomem conta' de previdência de servidores
PEC abre possibilidade de a previdência
complementar ser gerida por entidades sem compromisso com a administração
pública; medida apresenta riscos sobre pagamentos de aposentadorias futuras
Por PALOMA SAVEDRA
Publicado às 06h00
de 19/05/2019 - Atualizado às 16h59 de 19/05/2019
Rio - A reforma previdenciária do governo Bolsonaro traz uma série de
mudanças nas regras voltadas ao funcionalismo do país. A proposta não só busca
equiparar as normas do setor público às da iniciativa privada, mas também
obriga que todos os servidores, independente do ente federativo, tenham
previdência complementar — hoje, facultativa e só alcançando quem tem salário
acima do teto do RGPS (R$ 5.839,45). O texto abre ainda a possibilidade de
a mesma ser administrada por uma instituição financeira privada — ainda que com
licitação —, na contramão de como funciona atualmente.
Na prática, essa modificação tira a segurança de servidores públicos,
principalmente daqueles que ainda estão longe da aposentadoria.
No Estado do Rio de Janeiro, há o RJPrev, que alcança o grupo de
funcionários públicos que ingressaram no cargo a partir de 2013. E, no âmbito
do funcionalismo da União, os servidores que entraram no serviço público também
naquele mesmo ano podem aderir à Funpresp. Todos esses fundos são geridos por
instituições públicas e seguindo normativas.
Mas se a Proposta de Emenda à Constituição 6 for aprovada, a promessa é
de mudanças radicais. E essas brechas sobre a previdência complementar contidas
no projeto chamam atenção de juristas e das categorias do serviço público da
União, estados e municípios.
Questionado pela Coluna sobre as possíveis consequências de um banco
privado 'tomar conta' da previdência complementar, o especialista em Direito
Previdenciário e juiz do Trabalho, Igor Rodrigues, pontua algumas. Entre elas,
a falta de participação do funcionalismo na gestão dos recursos.
Resultados arriscados
"Há riscos sérios com relação à gestão desses ativos. Atualmente,
as entidades de gestão da previdência complementar do servidor são também
públicas, e respeitam os princípios da administração pública, de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Têm participação efetiva
dos servidores e são vocacionadas a uma administração com baixo risco e visando
o longo prazo das aplicações, sem qualquer preocupação de lucro próprio",
explica.
O magistrado ressalta que as entidades privadas não têm obrigação de
respeito aos princípios da administração pública. "Por conta disso, há uma
tendência de adotarem investimentos com foco na sua própria lucratividade e em
resultados de curto prazo, mais arriscados", alerta.
Segundo Rodrigues, ao tratar de Previdência, a gestão dos recursos
deveria buscar o menor risco possível e ser pensada no longo prazo. E ele frisa
que isso "diverge do perfil normalmente adotado por instituições
privadas".
Cabe destacar que, no caso de o resultado da licitação entregar a gestão
previdenciária a instituições privadas, o servidor se tornaria um "cliente
compulsório". "Ele acabaria condicionado à adesão de seus recursos a
essa entidade, sem a possibilidade de escolha".
Sem aporte do Tesouro, servidor não terá garantias
O pagamento de futuras aposentadorias é o principal alerta que o
funcionalismo faz sobre essa mudança na previdência complementar. Presidente do
Fórum Nacional das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques
classifica o repasse da gestão para entidades privadas como uma
"privatização". E afirma que, "caso os investimentos desses
fundos sejam frustrados (pelas instituições), não haverá qualquer aporte do
Tesouro para assegurar uma renda mínima".
"Essa privatização deixa os servidores públicos federais, estaduais
e municipais sem garantias estataisde uma aposentadoria digna. A PEC 06 elimina
o caráter público das fundações de previdência complementar dos
servidores", declara.
Aposentado pode ter tributação maior
O especialista Igor Rodrigues acrescenta que, em relação ao servidor já
aposentado ou pensionista, não há risco de perda do benefício. "Para
esses, o maior risco é o aumento da tributação incidente sobre aposentadoria ou
pensão, o que poderia fazer com que o valor final líquido do benefício acabe
reduzido".
O magistrado lembra ainda que, para quem está na ativa, "há o risco
de má gestão dos recursos destinados à previdência complementar, o que pode
importar em redução dos benefícios futuros".
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