sexta-feira, 23 de setembro de 2016

A Lei do Escambo: Solução ou risco para as contas públicas?

A compensação de dívidas com créditos tributários foi aprovada pela lei 7.298 de 31 de maio de 2016. Foi a solução encontrada pelo Governo do Estado que não conseguia pagar em dia as suas contas de energia, telefonia, combustíveis e etc. com as concessionárias de serviço público e distribuidoras.

Com a regulamentação feita a partir do Decreto n° 45,701 de 30/06/2016 começaram a serem publicados no Diário Oficial os instrumentos que permitiam realizar essas compensações.

Apesar de o Código Tributário Nacional prever esse tipo de operação nos artigos 170 e 170-A, ficou a dúvida se realmente seria algo saudável do ponto de vista da gestão pública, principalmente das melhores práticas de gestão orçamentária. Será necessária uma análise mais profunda sob a ótica da Lei de Responsabilidade Fiscal. Por ora, vamos fazer uma análise preliminar.

Sob um ponto de vista simplista, não há qualquer prejuízo aos cofres públicos, uma vez que uma despesa assumida será abatida com a arrecadação que não vai entrar. R$ 1 de valor da conta de luz contra R$ 1 de imposto. Então qual o problema?

Redução artificial da arrecadação

Ao dar créditos tributários, o Estado está reduzindo a sua arrecadação. Isso embaralha os números de séries históricas e comparativas por segmento e empresa. Além dessa perda estatística, reduz-se também a base de cálculo dos valores dos repasses obrigatórios em lei, representados por um percentual da arrecadação.
Ex: Se a arrecadação de um período é de 1 bi e a lei garante 12% de repasse para a saúde, esta receberia 120 milhões.
Se o estado compensa 50 milhões em contas, a arrecadação auferida cairia para 950 milhões e o repasse para a saúde cai para 114 milhões.

Redução artificial das despesas

Do mesmo modo, sem lançar o valor da conta como despesa, os números estarão desiquilibrados, dando a impressão de que o governo reduziu as despesas, quando na verdade, as manteve.

Controle, Transparência e possibilidade de desvios

Apesar de a SEPLAG ser o órgão responsável pela conferência das contas de consumo, como usualmente é feito, não há a publicidade dos valores envolvidos de renúncia fiscal e do montante pago em contas. Como envolve renuncia tributária, um concessionário mal intencionado poderia inflar artificialmente o valor de uma conta para se creditar de uma isenção maior. Mesmo se uma posterior fiscalização percebesse o desvio, o prejuízo estaria materializado pela não entrada de recursos em um momento agudo de crise.

Aspectos legais

A LRF prevê o valor apurado da Receita líquida como balizador de diversos parâmetros, como o teto de despesa de pessoal, por exemplo. Em época de crise e calamidade pública, qualquer queda na Receita Corrente Líquida, pode significar a demissão de um servidor.
Além disso, algumas concessionárias são grandes devedoras do fisco estadual. Como fazer renúncia a um devedor?


Resumindo, o que aparenta ser um simples encontro de contas possui implicações importantes que não estão sendo levadas em conta. Esperamos que essa prática que se assemelha ao popular “jeitinho” não se torne comum na administração pública.

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