Rioprevidência não garante salários em dia até o
fim de 2018; inativos temem atrasos
Nelson Lima Neto e Geralda Doca 12/08/2018
O sorriso fugiu do rosto da
pensionista Maria da Glória Barboza Nascimento, conhecida como Glorinha entre
os vizinhos e amigos do bairro de Vista Alegre, onde mora na Zona Norte do Rio.
O semblante de preocupação persegue a senhora que completou 65 anos na última
quinta-feira. Para quem sofreu com os atrasos a partir de janeiro de 2016, a
angustia mensal é recorrente até que o Estado confirma a data do pagamento de
sua pensão.
— Que a gente tenha um final de
ano digno, com nossos salários em dia e o 13º pagos corretamente. Temos medo
todo mês com essa incerteza antes do anúncio da data do pagamento — disse.
A cada aproximação da data do
pagamento, a suspeita ressurge, muito em função do silêncio do Estado até
poucos dias do prazo para que o depósito seja feito em dia. Para a aposentada
Elza Braz, da secretaria de Fazenda, o sonho é voltar a ter o dia a dia de
antes da crise.
— Ninguém sabe como as coisas
vão ficar no futuro. Queremos ter previsibilidade. Saber quando vamos receber.
Queremos nossas vidas de volta. Vivemos um massacre — disse a aposentada, que
chegou a ser detida pela polícia durante um dos protestos feitos pelos
servidores.
Nos últimos meses, o Estado tem
tentado equilibrar suas finanças. O maior reflexo é a manutenção dos salários
em dia e o pagamento das dívidas anteriores. O presidente do Rioprevidência
adverte, porém, que a crise está longe de passar.
— A gente vive um mês atrás do
outro. Não tenho como garantir o pagamento de todos os servidores em dia até
dezembro. É claro que faremos todos os esforços, mas a crise ainda não passou —
afirmou Reges Moisés dos Santos.
Ele disse que a folha de
pagamento mensal com aposentados e pensionistas custa R$ 1,4 bilhão e que as
receitas com contribuições giram em torno de R$ 400 milhões, R$ 500 milhões.
Com isso, todo mês há um déficit entre R$ 800 milhões a R$ 1 bilhão, que
precisa ser coberto pelo Estado.
Doença
crônica e síndrome do pânico viram sequelas
No caso da aposentada da
secretaria de Fazenda Elza Braz os dois anos de crise a levaram a morar em um
pensionato por mais de um ano, além do acúmulo de dívidas que a fizeram
contratar um empréstimo consignado de R$ 90 mil. Para piorar, as sequelas dos
protestos contras as medidas do governo e os atrasos salariais são sentidos até
hoje.
— Fui diagnosticada com uma
doença respiratória causada pelas bombas de gás lançadas pela polícia sobre os
servidores. É difícil até falar sobre o que vivemos. Sem contar na Síndrome do
Pânico diagnosticada no início deste ano — disse a aposentada.
Elza, por sinal, não vê
melhoras na situação do Estado:
— Não temos mais salvação.
Estamos desamparados. Não vejo melhora para o futuro.
Cestas
básicas e doações ajudaram durante a crise
O drama da aposentada da secretaria de Educação Mariuza
Conceição Aparecida, de 80 anos, ficou conhecido entre os servidores durante a
doação de cestas básicas para o Natal de 2016. Ao não receber uma das cestas,
Mariuza cantou jazz para os colegas, sendo convidada para shows e eventos como
forma de ajudá-la a minimizar a falta dos salários:
— Não gosto nem de pensar como seria se não tivesse
recebido as doações. Não desejo para ninguém. Nem para o governador.
Fazenda reforça esforço do
Estado na busca por equilíbrio
Diante do temor de inativos e pensionistas, a secretaria
de Fazenda reforçou o esforço que o Estado tem feito para equilibrar suas
finanças. A pasta lembrou da adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, com a
aplicação de ações de aumento da receita e a diminuição de despesas.
O Rio aderiu ao Regime de Recuperação em setembro de 2017.
Somente no início de 2018, o Estado começou a normalizar o pagamento dos
servidores. Boa parte das dívidas foram equacionadas em abril, com a quitação
do 13º salário de 2017. Para encerrar as pendências, o governo adotou medidas
como a antecipação dos royalties do petróleo, a elevação da contribuição dos
servidores à Previdência, além da antecipação de receita futura com a venda da
Cedae.
Inativos enfrentaram 19 atrasos
de folhas salariais
O Rio completou o 1º semestre de 2018 sem atrasar
salários. A previsão é de que o vencimento de julho seja pago na terça-feira,
dia 14, de acordo com o calendário previsto — até o 10º dia útil do mês
seguinte ao trabalhado. O cenário, porém, foi bem diferente entre janeiro de
2016 e dezembro de 2017. Foram, ao todo, 19 atrasos salariais, num total de 26
folhas (incluindo os 13º salários). A situação fez com que muitos adiassem ou
desistem de alguns projetos de vida.
— Eu tinha tudo programado para me mudar para Portugal.
Boa parte da minha família está lá. Vendi minha casa em Paquetá e estava
aguardando os últimos detalhes da documentação. Durante esse processo, o Estado
começou a atrasar os meus salários. Não tive condições de me mudar — lamentou a
ex-servidora da Fazenda estadual Elza Braz.
Já Dona Glorinha teve de lidar com o falecimento do filho
em meio à crise. Ainda no primeiro semestre de 2016, ela ficou sem pensão e sem
dinheiro para bancar o sepultamento.
— Contei com a ajuda de uma vizinha, que é uma irmã para
mim. Ela me emprestou R$ 500. Sempre prometi pagar, mas os atrasos não
permitiram. No final de 2016, ela me deu “de presente” o que usei — disse
Glorinha.
O pior momento foi em meados de 2017, quando o Estado
atrasou três folhas seguidas: maio, junho e julho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário