22/05/2015 |
Brasil Econômico |
Dificuldades de ajuste do setor público (Opinião)
|
Júlio Bueno
Em momentos de crise
econômica e das finanças de todas as instâncias de governo, como o atual,
fica evidente a enorme dificuldade de ajuste enfrentada pelo setor público
brasileiro. O fato é que o gestor público não tem flexibilidade alguma para
gerenciar os recursos que recebe: não pode reduzir o custo da folha de
pagamento e, mais que isso, tem recursos determinados constitucionalmente que
é obrigado a garantir, mesmo que, eventualmente, não sejam necessários.
A Constituição exige, por
exemplo, que 25% dos recursos arrecadados sejam direcionados para a Saúde e
12%, para a Educação. Por vezes, pode ser mais importante colocar recursos na
área educacional do que na Saúde, mas essa escolha não é possível. Essa
obrigatoriedade causa uma distorção enorme, já que nunca é possível antever,
exatamente, a arrecadação com a qual se pode contar.
É muito difícil dispor da necessária flexibilidade em relação aos recursos e, em momentos de crise, isso se torna mais complexo, pois é preciso, mais que nunca, administrar melhor os gastos. Para os governos, a situação é bem diferente da área privada que, em uma crise, pode diminuir o ritmo de produção.
Na esfera governamental,
quando há redução da despesa corrente, não existe uma diminuição proporcional
do volume de despesas. Alguém considera viável reduzir o número de
atendimentos de um hospital ou de crianças nas escolas? Diante disso, a única
alternativa é ajustar os investimentos, o que é uma tragédia para um país
pobre como o Brasil.
É bom lembrar que esse
limite não é recente. Nos anos 70, a proposta que destinava percentuais fixos
de investimento em educação pela União (18%) e pelos estados e municípios
(25%) foi apresentada — e aprovada - pelo então senador da Arena, João
Calmon. O entendimento, naquele momento, era de que a vinculacão mudaria o
Brasil o que, como sabemos, não ocorreu.
Em países como a
Inglaterra, por exemplo, a vinculacão não existe. Aqui, é constitucional. De
cada R$ 1 que entra nos cofres dos estados, os governantes só podem decidir
sobre cerca de RS 0,08. Ou seja, o poder de decisão sobre a destinação dos
recursos é ínfimo.
A alternativa a esse
engessamento dos governantes é dar ao gestor a liberdade para que ele possa
gerir os seus recursos da forma que considere correta. Na verdade, o
Orçamento deveria ser constituído por uma ampla discussão com a sociedade e,
em particular, com as Assembléias Legislativas.
A manutenção dessa regra referenda uma desconfiança da sociedade sobre as decisões do poder executivo e, mais que isso, uma falta de confiança da sociedade em seu poder de cobrar e direcionar as decisões de governo. O direcionamento dos recursos do Orçamento é uma questão de responsabilidade do povo brasileiro. Será que não seria muito mais eficiente se, no lugar da vinculacão, o Orçamento fosse discutido em profundidade pela sociedade civil e pelo Legislativo?
Não quero aqui, em
nenhuma hipótese, questionar a importância e a legitimidade dos investimentos
em áreas cujo bom desempenho é claramente crucial para toda a sociedade, como
educação e saúde. Mas tenho usado a imagem de um corpo humano para mostrar a
importância que têm todas as áreas de atuação do setor público: existe a
cabeça, o cérebro, como são esses citados setores, mas uma unha encravada é capaz
de matar se não for tratada com os cuidados devidos. Tudo é importante. Aos
governantes deveria ser dada a responsabilidade de definir suas prioridades,
de acordo com as necessidades do momento.
Júlio Bueno é secretário estadual de Fazenda do Rio de Janeiro |
sexta-feira, 22 de maio de 2015
Opinião - Júlio Bueno
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