Globo,
p.39 (manchete de Rio)
Ajuste mais rigoroso / Após romper limite da dívida, estado terá de cortar
gastos e não poderá pegar empréstimos
A
crise financeira que atinge o Rio obrigará o governo do estado a adotar medidas
ainda mais duras pelos próximos dois anos para reduzir despesas, e não está
descartado nem mesmo que haja corte de pessoal. O motivo está num relatório que
detalha a situação das contas do estado, que será divulgado hoje no Diário
Oficial. Devido a quedas sucessivas da arrecadação de impostos nos últimos
meses, em agosto a dívida do estado ultrapassou em cerca de R$ 1 bilhão o
limite permitido pela LRF. Para se adequar à legislação, o Palácio Guanabara
terá que apertar os cintos: não poderá contrair novos empréstimos para arcar
com compromissos, nem gastar mais do que arrecada, numa espécie de economia de
guerra que deve durar até agosto de 2018. A Alerj, o MP, o TCE e o TJ também
terão que fazer ajustes em seus orçamentos.
O
relatório trará um balanço das contas do estado entre setembro de 2015 e agosto
deste ano. O documento mostrará que o percentual da dívida nesse período chegou
a 201,94% da receita corrente líquida — 1,94 ponto percentual a mais do que era
permitido. Por lei, a relação entre dívida consolidada líquida (tudo o que o
estado deve menos o que ele tem em caixa e outros recursos, como aplicações
financeiras) e receita corrente líquida (impostos mais transferências) não pode
superar 200%.
O
documento que será divulgado hoje também já deverá indicar algumas medidas que
o governador em exercício, Francisco Dornelles, terá que adotar para
reequilibrar as contas. Já se sabe que, para atender às regras previstas na
LRF, os gestores de órgãos públicos serão orientados a reduzir ainda mais suas
despesas. Até abril de 2017, o ajuste a ser feito deve corresponder a pelo
menos 25% do total do déficit. Em valores de agosto, isso equivaleria a R$ 250
milhões. Caso as receitas com impostos continuem a cair, o esforço para
economizar terá de ser ainda maior.
A
medida cria incertezas também sobre o futuro dos investimentos em
infraestrutura que o estado previa para o Rio de Janeiro, já que depende do
reequilíbrio das contas. O governo do estado havia prometido, por exemplo,
concluir as obras da Estação Gávea da Linha 4 do metrô até 2018. Mas, para
isso, precisaria captar cerca de R$ 500 milhões.
Mesmo
sem o estado ajustar as contas, poderá receber da União os repasses
constitucionais de Saúde e Educação. Já os repasses não obrigatórios,
conhecidos como transferências voluntárias, também estarão disponíveis até
agosto de 2018, mas serão suspensos após essa data caso o estado não regularize
sua situação. Foi por esse mecanismo, por exemplo, que a União repassou R$ 2,9
bilhões para o governo do estado no fim de junho, permitindo que o Rio
reequilibrasse as contas às vésperas da Olimpíada.
Nessa
estratégia para economizar, a equipe econômica do Palácio Guanabara vai adotar
uma interpretação de dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que
prevê prazos dobrados para que União, estados e municípios ajustem suas contas
em períodos de crise econômica como a atual. Em épocas de crescimento, o corte
de despesas deveria ocorrer em no máximo 12 meses. Ainda há dúvidas entre os
técnicos do governo se o estado poderá ou não sacar parcelas de empréstimos já
em andamento.
No
último relatório do governo do estado, divulgado no Portal da Transparência,
relativo ao período de maio de 2015 a abril de 2016, o percentual da dívida
sobre as receitas estava em 191%. Na época, o único estado que estava fora do
teto era o Rio Grande do Sul (217%). Minas Gerais também estava em situação
preocupante (183%). Essa não é a primeira vez que o Estado do Rio fica acima do
teto legal para o endividamento. Isso também aconteceu em 2002, mas foi por um
curto período.
Nesse
cenário, a Cedae será uma exceção. A empresa, por contar com receitas próprias
e não receber recursos diretos do tesouro estadual, poderá seguir com programas
de investimentos, que incluem um projeto para ampliar a rede de abastecimento
de água da Baixada Fluminense.
Desde
o fim de 2015, o valor total da dívida vem caindo, mas o problema é que o mesmo
se deu com as receitas, fazendo com que o estado superasse o teto de 200%. Na
comparação com setembro de 2015, o governo do estado até reduziu a sua dívida —
de R$ 101,1 bilhões para R$ 98,5 bilhões (queda de 2,6%). No entanto, a receita
arrecadada nesse período caiu ainda mais. Os R$ 2,4 bilhões a menos
representaram uma queda de 4,7% nos recursos disponíveis. O mesmo fenômeno de
crescimento da dívida já tinha ocorrido em 2015 em comparação ao ano anterior
(2014). Nesse período (2014-2015), a dívida cresceu 19,7%, mas por fatores que
não estavam relacionados com a arrecadação. Segundo a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) de 2017, o endividamento do Rio aumentou em 2014 devido ao
repasse de um volume maior de empréstimos já contraídos pelo estado. Outros
fatores foram a desvalorização do real frente ao dólar (que provoca impacto nas
dívidas contraídas na moeda) e a correção de 10,7% do valor total da dívida com
a União, com base no IGP-DI — indicador adotado para atualizar as dívidas.
Com
isso, apenas em 2015, o estado acabou pagando R$ 322,8 milhões a mais de
serviços da dívida (juros) em comparação com o ano anterior, o que representou
um crescimento de 4,8%. Além disso, em 2015, tiveram início o pagamento de
juros de novos contratos firmados junto a instituições financeiras privadas e
amortizações de contratos firmados com entidades internacionais.
Antes
de se adequar aos limites da LRF, o governo do estado, que já vinha tendo
dificuldades para captar recursos de empréstimos a longo prazo, fica impedido
até mesmo de se endividar a curto prazo para cobrir rombos no caixa, oferecendo
como garantia receitas da arrecadação nos meses seguintes. O plano original da
administração estadual era tentar manter sua máquina até 2019 em déficit
fiscal, gastando mais do que arrecada, tendo como justificativa o cenário de
recessão que influiu na arrecadação. Essa era a previsão da Lei de Diretrizes
Orçamentárias de 2017, encaminhada à Alerj e aprovada no fim de junho. Para
2017, por exemplo, a previsão é que o déficit alcançasse R$ 16,3 bilhões.
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